Testar os
limites da realidade, a expressão que Jim Morrison utilizava como um mantra! A
alquimia musical da banda norte-americana dos anos 60, The Doors, criou um
estilo único e inimitável. A fusão de Rock com poesia, adicionando uma dose de
teatro e outra de cinema. Com uma sonoridade estranha, extática e sinistra,
todos os quatro integrantes da banda tinham consciência do poder que a música
possui de despertar os sentimentos e afetar as emoções.
As teorias sobre confronto, do surrealista francês Artaud, exerceram profunda influência sobre a obra do The Doors, bem como sobre as performances de Jim. Na tese ‘O teatro e seu duplo’, Artaud reflete sobre como a arte dramática consegue levar o espectador a uma espécie de catarse. A intenção é aterrorizar o espectador até que ele desperte, fazer com que este perceba que antes estava morto e que após a experiência venha o despertar. Para Aristóteles, um dos fundadores da filosofia ocidental, CATARSE é a purificação da alma através de uma descarga emocional provocada pelo drama.
As teorias sobre confronto, do surrealista francês Artaud, exerceram profunda influência sobre a obra do The Doors, bem como sobre as performances de Jim. Na tese ‘O teatro e seu duplo’, Artaud reflete sobre como a arte dramática consegue levar o espectador a uma espécie de catarse. A intenção é aterrorizar o espectador até que ele desperte, fazer com que este perceba que antes estava morto e que após a experiência venha o despertar. Para Aristóteles, um dos fundadores da filosofia ocidental, CATARSE é a purificação da alma através de uma descarga emocional provocada pelo drama.
A transformação que Morrison
consegue proporcionar, é a mesma descrita por Aristóteles: “Os festivais de
mistério são eventos inesquecíveis, projetam suas sombras sobre toda a vida
futura das pessoas criando experiências que transformam a existência.” Na
descrição do historiador grego e filósofo platônico, Plutarco: “Vagando perdido
na escuridão, por caminhos assustadores que não levam a lugar algum, e então
diante do fim de todas as coisas terríveis, pânico e espanto (...) o iniciado
se liberta, fica livre de toda a escravidão e segue vagando, celebrando o
festival com outras pessoas puras e sagradas e olha com superioridade para os
não iniciados”.
Jim estava ciente de que por mais
aterrorizante que possa ser, é através do confronto com o medo, que se alcança
a liberdade. Após enfrentar o medo, você se liberta! O herói de Dante em sua
jornada precisou atravessar o “Bosque Sombrio”. O objetivo é se conectar a vida
confirmando a existência, atravessar o inferno para chegar ao paraíso. Morrison
nos conduz a uma espécie ímpar de ritual! Abrir portas para outras dimensões,
até então desconhecidas ou apenas adormecidas...
A música “The End” é muito mais
complexa do que hits como, “Hello, I Love You”, “Touch Me” ou mesmo a frenética
“Light My Fire”. O drama edipiano pertence à mesma categoria de músicas como
“Celebration Of The Lizard”, “The Soft Parade” e “When The Music’s Over”,
reunindo elementos místicos, símbolos atemporais com poder evocativo, imagens
poéticas que conseguem fotografar o “Pensamento Universal”.
A canção “O Fim” nasceu com
apenas dois versos, entretanto a cada apresentação, Morrison acrescentava e
modificava diversos versos. A consolidação ocorreu em uma noite que entrou para
História do Rock, após tomar inúmeras doses de ácido lisérgico, Jim foi até o
palco, se apoiou no pedestal do microfone, a cabeça inclinada, os olhos
fechados, e então a voz de Morrison começa com um tom fatalista de despedida,
um lamento, confrontando a única certeza de quem vive:
“Este
é o fim, caro amigo / Este é o fim, meu único amigo / O fim, dos nossos
elaborados planos / O fim, de tudo o que foi firme / O fim, sem escapatória ou
surpresa / O fim... Eu nunca mais olharei nos seus olhos, de novo
Você
consegue imaginar / Como será? Tão ilimitado e livre
Desesperadamente
precisando / Da ajuda de algum estranho / Em um mundo desesperador!”
A mítica serpente que aparece na
música “Celebração ao Lagarto” também aparece aqui. De modo geral, a serpente
pode simbolizar energia, força e regeneração e a característica “troca” de
pele, é tida como um símbolo de e renovação e renascimento. Em relação ao
simbolismo maligno que possui no cristianismo, a serpente assume uma postura
desafiadora e perturbadora. Entretanto no Oriente Médio, a serpente é uma
antiga divindade referente à sabedoria. No gnosticismo a imagem da serpente
representa a incorporação da sabedoria transmitida pela deusa Sophia. Na Índia,
ela é a guardiã das fontes da vida e da imortalidade, e dos tesouros
espirituais. Pode simbolizar o que seria a "sabedoria das
profundezas", um acesso ao inconsciente. Dentro da cultura Maia, no ritual
da “Serpente Visão”, o objetivo está em experimentar visões, e conforme esta
crença, tais visões se tornariam uma serpente gigante, que é a passagem para o
reino do espírito, um elo direto entre o reino espiritual e o mundo físico. Jim
quase que sussurra: “Ride the snake...”
A voz melancólica de Morrison, as
pausas entre as sílabas, somadas a sonoridade hipnótica da banda, seguem em uma
cavalgada psicodélica. Posteriormente é feito o prenúncio:
“O
ônibus azul... Está nos chamando / Motorista, para onde está nos levando?”
Jim nos conduz a uma cena
dramática isolada no tempo, uma tragédia edipiana, recitando os chocantes
versos, que compuseram a partir daquela noite a versão final da música:
“O
assassino acordou antes do amanhecer / Calçou as suas botas / Pegou uma foto da
antiga galeria / E andou pelo corredor! / Entrou no quarto da sua irmã / Então
ele... Fez uma visita ao seu irmão / E então ele... Andou pelo corredor e... /
Foi até a porta, e olhou para dentro / -Pai?! - Sim, filho?! -Eu quero te
matar. -Mãe?! Eu quero... Foder você!”
Após a próxima parte, os sons
começam a reproduzir um trem desgovernado, uma cavalgada intensa e caótica, com
Morrison gemendo sôfrego ao fundo, encenando no ritmo da música, golpes de
cólera ou o ato sexual propriamente dito. Passada esta parte, retorna a
atmosfera de mistério do início, trazendo consigo os marcantes versos:
“Dói
te libertar, mas você nunca me seguiria / O fim das gargalhadas e das mentiras
inocentes / O fim das noites em que nós tentávamos morrer...”
Existem inúmeras, diversas
interpretações para essa canção, mas Jim, baseado nas teorias de Freud,
descreveu uma delas como sendo uma despedida da infância.
O genial filósofo e poeta alemão,
Friedrich Nietzsche descreve no livro ‘O Nascimento Da Tragédia’, a visão de
Sófocles sobre o drama edipiano, onde Édipo representa “o personagem mais
triste do palco grego”. Nas palavras de Nietzsche: “Entretanto, através dos
seus indescritíveis sofrimentos, em última análise, Édipo exerce um efeito
mágico e curador sobre todos à sua volta, e este efeito persiste mesmo após sua
morte”.
Às pessoas limitadas a um
entendimento literal, que por impossibilidade ou desconhecimento não
compreendem os versos de Morrison, o tecladista Ray Manzarek, responde:
"Jim deu voz, nos moldes rock, para a obra de Sófocles, Édipo Rei, em
tempos de extensas discussões sobre tendências Freudianas na psicologia. Ele
NÃO disse que queria fazer aquilo com os próprios pais. Ele estava encenando um
trecho da dramaturgia grega. Isso era teatro!".
OBS: A tradução não contém a
letra da música na íntegra, traduzi apenas as partes que interessaram ao
propósito do texto.
Artigo de GABRIELA SATORI LANDIM